http://doi.org/10.14718/revfinanzpolitecon.2019.11.2.1

Editorial

A implantação dos acordos de paz e o desenvolvimento na Colômbia

Joan Miguel Tejedor-Estupiñan *

PhD (C) em Economia, mestre em Direitos Humanos e economista. Editor da revista Finanzas y Política Económica, da Universidad Católica de Colombia. E-mail: jmtejedor@ucatólica.edu.co. Endereço: Facultad de Economía, Universidad Católica de Colombia, Carrera 13 n.° 47-49, Bogotá, Colombia.
Orcid: 0000-0002-2346-3222


A Colômbia é um país multicultural e pluriétnico, rodeado por dois oceanos, milhares páramos, lagoas e rios que nascem na complexa geografia criada por três sistemas de cordilheiras. Um território que, desde os pontos mais altos até as planícies e as selvas —como o Tapón del Darién ou o Amazonas—, torna possível uma variedade quase infinita de ecossistemas e de formas de vida que inserem o país no grupo exclusivo de nações megadiversas. Uma nação rica em energia solar, eólica, fluvial, em recursos minerais, agrícolas e marítimos, mas com setores industriais e de serviços ainda em fase de desenvolvimento. Um país onde os altos níveis de violência, de pobreza e de desigualdade ainda fazem parte de sua realidade.

Em 24 de novembro de 2016, um acontecimento histórico deu início a uma transformação da sociedade colombiana: a firma do Acordo Final para o Fim do Conflito e a Construção de uma Paz Estável eDuradoura entre o governo da Colômbia e as Forças Revolucionárias da Colômbia (Farc-EP). O propósito desse acordo era fechar um capítulo do conflito armado interno, que, durante mais de seis décadas, gerou violência e instabilidade em todo o território nacional (Gobierno de Colombia e Farc-EP, 2016). O Acordo Final pretendia contribuir para melhorar uma complexa realidade: um conflito armado originado por outros atores como o Exército da Libertação Nacional (Ejército de Liberación Nacional — ELN), o Exército Popular de Libertação (Ejército Popular de Liberación — EPL), os traficantes de drogas, os paramilitares, as quadrilhas criminais emergentes e, inclusive, grupos de delinquentes e de corruptos que atuam de forma organizada nas diferentes instituições e corporações que compõem os poderes executivo, legislativo e judiciário do Estado colombiano (Centro de Memoria Histórica, 2013).

Unido aos fenômenos do conflito e da violência, o desenvolvimento ambiental, social e econômico na Colômbia se vê ameaçado por altos níveis de desflorestamento, pela exploração de recursos minerais e de combustíveis fósseis em territórios de grande valor ecológico e ambiental, pela poluição do ar, dos rios e da terra cultivável. Além disso, o desenvolvimento humano e econômico está sendo afetado de forma negativa por elevados níveis de desigualdade, pobreza, desemprego, informalidade e baixos níveis de produtividade e desindustrialização. Embora a Colômbia tenha sido admitida na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), os índices evidenciam violação dos direitos econômicos, culturais, sociais e ambientais dos colombianos.

Segundo o relatório Latinobarómetro 2018, somente 13% dos cidadãos latino-americanos estavam de acordo com as políticas de seus governos; uma grande redução em comparação com 30% registrados em 2017. Em 2018, na Colômbia, somente 16% dos entrevistados expressaram confiar nos partidos políticos; 20% afirmaram que confiavam no Congresso e 22% manifestaram confiar no governo. Para os colombianos, o principal problema a superar é a corrupção (Corporación Latinobarómetro, 2018). O relatório de Transparencia Internacional (2017), que apresenta o índice de percepção da corrupção, indica que, na Colômbia, a taxa de suborno é de 37%, a mais alta da região. O Relatório de perspectivas econômicas para a América Latina da OCDE (2018) também destaca que 79% dos latino-americanos acreditam que seus governos são corruptos, 12 pontos a mais que o registrado em 2010. De acordo com esse relatório, a Colômbia está nos últimos lugares do ranking (OCDE, CAF e ECLAC, 2018).

O Relatório global de capital humano (Foro Económico Global, 2017) posiciona a Colômbia no 682 lugar sobre a média da região e destaca que os níveis de desemprego têm superado 6,7% e continuam aumentando. Além disso, o Índice de Democracia 2017 categoriza a Colômbia como uma democracia enfraquecida (The Economist Intelligence Unit, 2018); numa escala de 0 a 10, em que 10 é o mais alto, a Colômbia obteve, em 2017, uma pontuação de 6,67. Esses indicadores mostram ao governo entrante os principais desafios de governança e de governabilidade que deve enfrentar, o que inclui a implantação do Acordo Final de Paz com as Farc e a continuidade dos diálogos com outros grupos à margem da lei.

A corrupção e o conflito armado na Colômbia são os principais obstáculos tanto para o desenvolvimento humano e econômico quanto para o respeito dos direitos humanos e dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais. Por isso, convém ressaltar três momentos eleitorais que, nos últimos quatro anos, marcaram os processos contemporâneos de transformação política, social e econômica que o país atravessa hoje.

a. O Plebiscito pela Paz de 2 de outubro de 2016, em que a pergunta formulada aos colombianos foi: "Você apoia o Acordo Final para o Fim do Conflito e a Construção de uma Paz Estável e Duradoura?" Os resultados mostraram que, de quase 34,9 milhões de pessoas habilitadas para votar, somente 37,46% participaram desse pleito eleitoral, em que 49,78% dos eleitores votaram "sim" e 50,21% votaram "não" (Registraduría Nacional del Estado Civíl, 2016). O Acordo Final foi ratificado pelo Congresso da República da Colômbia.

b. A Consulta Anticorrupção de 26 de agosto de 2018, em que o mecanismo de participação atingiu 32,05% do censo eleitoral e não superou o limite de participação exigido pelo item c do artigo 41 da Lei 1.757 de 2015, razão pela qual foram estancados na agenda de política pública temas como: redução do salário dos congressistas e altos funcionários do Estado, prisão de corruptos e proibição de que estes voltem a serem contratados pelo Estado, contratação transparente obrigatória em todo o país, orçamentos públicos com a participação da cidadania, prestação de contas de assistência, votação e gestão dos congressistas, divulgação das propriedades e dos ingressos injustificados de políticos eleitos, extinguindo deles o domínio e um máximo de três períodos em corporações públicas (Registraduría Nacional del Estado Civil, 2018a).

c. As eleições presidenciais de 17 de junho de 2018 na Colômbia, em que, no segundo turno, o candidato do partido Centro Democrático (partido liderado por Álvaro Uribe Vélez) Iván Duque Márquez venceu com 10.373.080 votos (53,98%) a Gustavo Petro, do movimento Colombia Humana, que contou com 8.034.189 votos (41,81%) (Registraduría Nacional del Estado Civíl, 2018b).

Enquanto o primeiro processo era apresentado como uma solução parcial do conflito armado com a Colômbia, o segundo constituía uma esperança para diminuir os níveis de corrupção que freiam o desenvolvimento. Com a eleição de Iván Duque, é estabelecida uma mudança de sentido na política nacional, após sua proposta de mudar o Acordo de Paz, ao considerá-lo excessivamente indulgente com os ex-guerrilheiros das Farc, e com a promessa de governar para as classes populares, reduzindo os impostos e aumentando os salários. Com um ano de governo, os resultados ante os desafios sociais e econômicos são desesperançosos. As críticas estão relacionadas com aspectos como a intervenção nos assuntos da Venezuela e a falta de atenção à crise humanitária que se vive no âmbito nacional, na qual, desde a firma do Acordo, 137 ex-combatentes das Farc foram assassinados (Revista Semana, 2019). Enquanto o governo anunciava, dentro de suas conquistas, a erradicação de 80.000 hectares de coca, ou de ter criado 60.000 empregos em um ano (tendo prometido criar 600.000 em quatro anos), a ONU posiciona a Colômbia como a produtora de 80% da cocaína exportada no mundo inteiro (UNODC, 2019).

As dinâmicas não melhoraram em um ano nem para esse governo nem para o país, e a falta de governança tem sido evidenciada tanto na queda da Lei de Financiamento e da proposta de reforma da justiça quanto na objeção da Jurisdição Especial para a Paz (JEP), que finalmente teve que ser firmada (The Economist, 2019). A desvalorização do peso colombiano em comparação com o dólar e o euro é um dos principais indicadores da falta de produtividade pela qual a economia colombiana atravessa. O desemprego passou de 9,2% em agosto de 2018 a 10,8% em agosto de 2019 (Dane, 2019). Por fim, prevê-se que o crescimento econômico para 2019 seja menor que 3% (Portafolio, 2019).

A realidade que se vislumbra nas cifras apresentadas torna evidente que os principais temas da agenda nacional são a superação do conflito armado e a redução da brecha do desenvolvimento humano, social e econômico. Com certeza, espera-se que o governo garanta a implantação do Acordo Final firmado com as Farc e que as promessas de campanha sejam cumpridas, entre outras, as de gerar empreendimento com a economia laranja e impor taxas aos mais ricos para melhorar as condições da classe trabalhadora. Se não for assim, é possível que surja um descontentamento de diferentes setores da sociedade civil, que se manifestarão por seus direitos e ante o incumprimento das metas do governo; por isso, deverá ser gerado um diálogo nacional para a saída negociada das problemáticas citadas.

Com o objetivo de contribuir a partir do contexto científico, a revista Finanzas y Política Económica apresenta, em sua nova edição, um grupo de nove documentos originados em países como a Espanha, a Colômbia, a Jordânia e o México, os quais abordam temas como o Teorema de Rolle e sua relação com as taxas internas múltiplas de retorno, os determinantes da balança comercial bilateral do México, o desenvolvimento da infraestrutura de transporte e a concorrência entre os países-membros da Aliança do Pacífico, os efeitos dos cartões de crédito na estrutura de consumo e a desigualdade dos lares mexicanos, a gestão de resíduos sólidos urbanos na América Latina, os cenários de um turbulento Brexit, a integração entre mercados de petróleo de diferente qualidade baseada nas correlações condicionais dinâmicas, a estrutura de capital-nexo de valor da empresa como papel moderador da rentabilidade e, finalmente, o efeito da heurística da ancoragem e do ajustamento e o viés de otimismo nas previsões do mercado de valores.



REFERÊNCIAS

1. Centro de Memoria Histórica. (2013). ¡Basta Ya! Colombia: Memoria de guerra y dignidad. Bogotá: Autor. http://www.centrodememoriahistorica.gov.co/descargas/informes2013/bastaYa/basta-ya-colombia-memorias-de-guerra-y-dignidad-2016.pdf

2. Corporación Latinobarómetro (2018). Latinobarómetro Report 2018. Santiago: Autor. http://www.latinobarometro.org/lat.jsp

3. Departamento Administrativo Nacional de Estadística (DANE) (2019). Gran Encuesta Integrada de Hogares (GEIH) - Mercado laboral. https://www.dane.gov.co/index.php/estadisticas-por-tema/mercado-laboral/empleo-y-desempleo

4. Gobierno de Colombia y FARC-EP (2016). Acuerdo Final para la Terminación del Conflicto y la Construcción de una Paz Estable y Duradera. La Habana. https://www.mesadeconversaciones.com.co/sites/default/files/24_08_2016acuerdofinalfinalfinal-1472094587.pdf

5. OECD/CAF/ECLAC (2018). Latin American Economic Outlook 2017: Rethinking Institutions for Development. París: Autor. https://doi.org/10.1787/leo-2017-en

6. Portafolio (2019). Economía colombiana crecería por debajo del 3% en el 2019. https://www.portafolio.co/economia/proyecciones-crecimiento-colombia-531855

7. Registraduría Nacional del Estado Civil (2016). Resultados Plebiscito 2 octubre 2016 - República de Colombia. https://elecciones.registraduria.gov.co/pre_plebis_2016/99PL/DPLZZZZZZZZZZZZZZZZZ_L1.htm

8. Registraduría Nacional del Estado Civil (2018a). Consulta Anticorrupcion 2018. https://www.registraduria.gov.co/-Consulta-Anticorrupcion-2018-.html

9. Registraduía Nacional del Estado Civil (2018b). Registraduría Nacional del Estado Civil - Revocatoria del mandato. https://www.registraduria.gov.co/-Presidencia-.html

10. Revista Semana (2019). Radiografía de los asesinatos contra exguerrilleros de las Farc. https://especiales.semana.com/crimenes-en-contra-de-las-farc/137-asesinatos-y-contando.html

11. The Economist (2019). Can Colombia's President Iván Duque find his feet? http://www.economist.com/the-americas/2019/06/20/can-colombias-president-ivan-duque-find-his-feet

12. The Economist Intelligence Unit (2018). Democracy Index 2017. The Economist' The Intelligent Unit. London. https://www.eiu.com/topic/democracy-index

13. Transparencia International (2017). Corruption Perceptions Index 2017. https://doi.org/978-3-943497-18-2

14. UNODC (2019). World Drug Report 2019. http://wdr.unodc.org/wdr2019/

15. Foro Económico Mundial (2017). The Global Human Capital Report 2017. https://doi.org/ISBN978-1-944835-10-1



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